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Manifestantes acampam no campus da Universidade de Columbia para protestar em prol dos palestinos
Manifestantes acampam no campus da Universidade Columbia para protestar em prol dos palestinos, com mensagens antissemitas como “Volte para a Polônia" e “10 mil vezes 7 de outubro", em Nova York, nos EUA (19/4/2024) | Foto: Reuters/Caitlin Ochs
Edição 215

Os antissemitas ‘pacifistas’

Nas universidades americanas, a liberdade de expressão deu lugar à intolerância, à apologia ao crime e ao terrorismo

Eugenio Goussinsky
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O lema das principais universidades dos Estados Unidos (EUA) se baseia nas palavras “verdade”, “luz” ou “liberdade”. As instituições foram criadas, nos séculos 18 e 19, como arcabouços morais e inspiração para um país moldado na democracia e no conhecimento.

Nas últimas semanas, em quase 40 delas, a mensagem revelou uma mudança. Milhares de estudantes acamparam nos locais de ensino e, com bandeiras da Palestina e bandanas do Hamas, trocaram os dizeres tradicionais por mensagens antissemitas, como “Volte para a Polônia” e “10 mil vezes 7 de outubro”.

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A liberdade de expressão deu lugar à intolerância, à apologia ao crime e ao terrorismo. Tudo sob o pretexto de criticar as ações de Israel na Faixa de Gaza, depois das barbaridades cometidas pelo Hamas em 7 de outubro, quando os terroristas assassinaram brutalmente cerca de 1,2 mil pessoas, a maioria civis, e fizeram 235 reféns.

No novo cenário, mais do que a causa palestina, jamais defendida pelo grupo terrorista, tem prevalecido um assustador antissemitismo. Inserido no setor de educação do maior aliado de Israel. Nos jovens que formarão as futuras gerações.

Tal situação é um preocupante retrato da atual geopolítica mundial, em que influências, muitas delas ocultas, visam a enfraquecer o poderio ocidental. Distorcendo o debate para uma guerra de civilizações, o movimento projeta a guerra da Faixa de Gaza nas alamedas das instituições de ensino.

Dependência de doações

Cada vez mais as universidades americanas têm sustentado suas finanças nos endowment (doações). Na Universidade Yale, por exemplo, o mecanismo arrecadou US$ 1,4 bilhão e correspondia a 34% da receita em 2019. Países que, por razões ideológicas, religiosas e de mercado, se contrapõem à aliança entre Israel e Estados Unidos ampliam seus tentáculos para dentro das instituições.

Segundo o Departamento de Educação (ED) dos EUA, o Catar, a China, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes (os dois últimos aliados dos EUA) injetaram nas universidades pelo menos US$ 6,6 bilhões em dois anos. O maior investidor é o Catar, com cerca de US$ 3 bilhões anuais. A nação, comandada pela dinastia Al Thani, age com uma política ambígua — moderna e tirânica. Amplia mercados e, ao mesmo tempo, dá suporte a grupos terroristas.

O departamento norte-americano já declarou que tais fundos investidores são um “risco para a segurança nacional”. Os valores, certamente, são ainda mais altos. Muitas universidades ocultam os investimentos, temerosas em revelar a origem poluída do dinheiro. Tal iniciativa é irregular, por ferir a Seção 117 da Lei do Ensino Superior. Ela determina que qualquer doação acima de US$ 250 mil de estrangeiros precisa ser declarada.

O estudo Follow the Money, apresentado em 2019 no Departamento de Justiça norte-americano, revelou, pela primeira vez, a existência de financiamento substancial do Oriente Médio, principalmente do Catar, para universidades dos EUA sem o devido aviso para o ED. “Nos últimos anos, regimes totalitários do Oriente Médio, organizações terroristas, fundações e empresas privadas afiliadas canalizaram bilhões de dólares para universidades norte-americanas com o objetivo de promover um ambiente que encoraje a demonização de Israel e dos judeus dentro do currículo e no campus”, diz o relatório do Instituto para o Estudo do Antissemitismo e Política Global (ISGAP, na sigla em inglês).

O maior financiador

Os mais significativos são os investimentos do Catar, país que abriga o líder do grupo terrorista Hamas e costuma financiar grupos radicais. Um objetivo é criar alianças tecnológicas com os EUA. Isso em um momento no qual a região busca compensar o surgimento de energias alternativas, que tiram o monopólio do petróleo.

Mais do que isso, porém, as verbas visam a enfraquecer o laço norte-americano com Israel e isolar o país judaico. “O apoio financeiro do Catar ao Hamas de US$ 30 milhões por mês é comprovado e público”, afirmou Didier Billion, vice-diretor do Instituto Francês para Assuntos Internacionais e Estratégicos (IRIS), segundo a rede de televisão francesa France 24.

As diretorias das entidades de ensino perceberam tarde que a permissividade em relação às manifestações era prejudicial

O plano do Catar é sutil e dúbio. O país que tenta abalar a maior democracia do planeta também se aproxima do Ocidente ao criar a Education City na capital Doha, formada pelos campi de seis grandes universidades norte-americanas. “Essa integração entre universidades dos EUA e governos estrangeiros permite que países como o Catar exerçam influência e promovam um plano de estudos pró-islâmico nos currículos e campi universitários”, acusa o estudo da Follow the Money.

Com os financiamentos, o Catar exige contrapartida que traga benefícios à população catari e, ao mesmo tempo, insira dogmas no cotidiano dos universitários. “As redes de influência do Catar não podem ser consideradas soft power [influência sem uso da força], uma vez que dependem mais do poderio financeiro dos pagamentos para atingir os resultados, uma forma de hard power [poder por extorsão]”, diz outro trecho do trabalho.

As manifestações são uma continuidade do movimento Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), lançado há alguns anos também nas universidades e que prega o boicote a produtos de empresas israelenses.

As diretorias das entidades de ensino perceberam tarde que a permissividade em relação às manifestações era prejudicial. Entre as centenárias instituições em que ocorreram vandalismo estão as oito integrantes da Ivy League, universidades de ponta que têm em comum a existência da hera (ivy), planta que cobre os muros locais. A intolerância dos manifestantes impediu a entrada de alunos judeus ao campus, como na Universidade da Califórnia (UCLA).

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Os financiamentos fizeram efeito. De acordo com o Follow de Money, do ISGAP, as universidades que recebem as maiores somas do Catar são as que mais se alinham aos aspectos antidemocráticos destes governos do Oriente Médio. Os investimentos atingem em cheio movimentos acadêmicos que necessitam de verbas para projetos e cursos. Espaços multiculturais, assim, são influenciados pela agenda de seus financiadores. “Para o Catar, uma instituição acadêmica é uma ferramenta legítima para alcançar os seus objetivos de política externa”, afirma Ariel Admoni, mestre em Estudos do Oriente Médio da Universidade Bar-Ilan.

Pacifistas violentos

A lavagem cerebral deixou as diretorias em xeque. Grandes financiadores judeus e aliados de Israel ameaçaram retirar as doações. Pressionados, os dirigentes das universidades passaram a coibir publicamente as manifestações. Prisões ocorreram depois de a Universidade Columbia, epicentro dos protestos, pedir para a polícia de Nova York desfazer um acampamento no campus

Os estudantes, que até então se diziam pacifistas, agiram com violência e depredaram prédios da entidade. Mais de mil manifestantes foram detidos no país. Na UCLA também ocorreram tumultos. Os locais, depois de esvaziados, ficaram imundos. Alunos foram suspensos em várias universidades.

Estudantes vandalizam, fazem barricadas e ocupam o Hamilton Hall, na Universidade de Columbia, em Nova York (30/4/2024) | Foto: Reuters/David Dee Delgado

O colunista inglês Brendan O’Neill, da Spiked, descreveu as cenas como a “raiva dos privilegiados contra a única nação judaica do mundo”, ao se referir aos preços médios de US$ 90 mil anuais dos cursos.

“Nesses protestos ostensivamente ‘antiguerra’, os estudantes exigiram a destruição total de Israel, ao mesmo tempo que agitavam cartazes em apoio ao Hamas”, escreveu a colunista Joanna Williams, também da Spiked.

A anuência inicial das universidades contou com a colaboração dos próprios professores. “Longe de condenarem as explosões preconceituosas dos manifestantes estudantis, os professores saem em sua defesa”, alertou Joanna. “Quando o antissemitismo é banalizado dessa forma pelos acadêmicos, os estudantes são encorajados nas suas crenças.”

Em declaração para o site Alhurra, em julho de 2020, Najat Al-Saeed, pesquisador dos Emirados Árabes Unidos, acrescentou mais um dado. Ele destacou que, para atingir seus objetivos, o Catar utilizou a Irmandade Muçulmana, grupo egípcio que inspirou o Hamas, para se aliar à esquerda radical norte-americana. “Um número crescente de professores e estudantes filiados à aliança Esquerda-Irmandade está usurpando a liberdade de pensamento nas universidades dos EUA.”

Em artigo no The Jerusalem Post, o professor Yaron Friedman, do Departamento do Oriente Médio e Estudos Islâmicos da Universidade de Haifa, é direto sobre a influência do Catar: “Quem está por trás dos protestos nos campi dos EUA?”. Em seguida, ele prossegue:

“Quem financia o Hamas? Quem dissemina propaganda de apoio ao terror de Gaza globalmente através da Al Jazeera? Quem financiou os jihadistas que devastaram a Síria na guerra civil? Quem conduziu as negociações enganosas entre os EUA e o Talibã sobre o futuro do Afeganistão? Quem continua a financiar a Irmandade Muçulmana em todo o mundo? Quem roubou a Copa do Mundo e corrompeu a Fifa?”

Sobrevivente dos ataques do Hamas, o produtor israelense Chen Mizrachi, de 35 anos, levanta outro ponto. Os bilhões de dólares de nações árabes investidos nas universidades ajudariam a melhorar a qualidade de vida em Gaza. Esse, segundo ele, não é o interesse de países como o Catar.

“Isso se voltará contra as próprias universidades, como se voltou para nós, porque tentamos ajudar o povo palestino, dando-lhes empregos, eletricidade”, afirma. “Muitas universidades simplesmente aceitam suborno dos árabes para apoiá-los, e o dinheiro não é um problema para os árabes.”

A alegação de Israel de que seu exército não tem civis como alvo em Gaza abre o debate para mais uma questão: por que os manifestantes não demonstram sensibilidade em relação aos reféns do Hamas e simpatizam com um grupo que cometeu atrocidades?

Joanna Williams tem uma resposta: por causa do discurso de ódio. “Sim, devemos defender o direito de protestar”, afirma a colunista. “Ao mesmo tempo, é vital que façamos um cálculo honesto sobre como o antissemitismo pôde crescer sem contestação.” Antes que ele se torne o novo lema.

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4 comentários
  1. Cristiano Fortes Lopes Donzele
    Cristiano Fortes Lopes Donzele

    Uma reportagem extremamente alarmante e preciosa. Parabéns ao Jornalista Eugênio G.

  2. Marcelo Gurgel
    Marcelo Gurgel

    Jovens idiotizados.

  3. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Dá pra perceber que os dirigentes de universidades, assim como metade dos cientistas do mundo se venderam aos tiranos multimilionários Árabes e a nova ordem mundial e os estudantes seguem esses absurdos como uma manada de jumentos

  4. Luiz Antônio Alves
    Luiz Antônio Alves

    mESES ATRÁS pedi para um vizinho se ele saberia dizer qual a área ou território que dever ter a Palestina em caso de formação do novo estado, pois até ali ninguém me ofereceu o mapa definidor do assuto. A resposta veio rápica como um míssil: nós queremos liquidar Israel e tomar todo o território. Ou seja, GAza é um instrumento de propagação do ódi contra os judeus e é apenas um elemento para o objetivo final. Ou seja, chegamos a um ponto que não tem mais volta. Se eles conseguirem destruir Israel e expulsar seus habitantes irão perseguir os judeus em qualquer lugar do planeta, inclusive aqui no Brasil.
    Infelizmente o Biden é muito fraco e a partir dele os Estados Unidos perdeu o respeito de muitas nações.

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