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Edição 214

Juízes da verdade

Quando há alguém decidindo o que é a verdade, para suprimir o que decide ser mentira, usurpa-se o direito sagrado de cada um de escolher o que é verdade e o que é mentira

Alexandre Garcia
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No cinquentenário da Revolução dos Cravos, aqui em Portugal, eu caminhava portando cravos no meio do povo que lotava a Avenida da Liberdade, quando fui abordado por uma equipe da CNN, para uma foto. Contei a eles que havia sido “demitido” da CNN Brasil momentos depois de ter repetido que a covid-19 tem tratamento, já que testemunhara que minha mulher médica havia tratado mais de cem pacientes e nenhum deles precisou de hospital. A repórter sorriu e me disse que “aqui não existe isso, aqui é livre”. É o que tem repetido o português Sérgio Tavares, interrogado sobre suas ideias políticas quando chegou a Guarulhos no dia 25 de fevereiro. Aqui em Portugal, em 25 de abril, há 50 anos se comemora o fim da censura, da polícia política e do crime de opinião. O dia 25 de abril é feriado nacional, Dia da Liberdade.

No Brasil, em 23 de abril, completou dez anos de vigência o Marco Civil da Internet, lei que estabelece que as plataformas não podem tratar de modo diferente seus usuários, que deve ser resguardada a privacidade de seus frequentadores e que a internet é um lugar de liberdade de expressão. A Lei nº 12.965 foi sancionada pela presidente Dilma, com a assinatura de três ministros do PT, inclusive Paulo Bernardo, então marido de Gleisi Hoffmann, atual presidente do PT. O projeto fora debatido por três anos na Câmara e no Senado, e na época o PT e a esquerda não viram necessidade de inventar censura nas redes sociais, mesmo porque isso é vedado pela Constituição. 

Orlando Silva - Projeto da Censura
Orlando Silva, deputado federal pelo PCdoB, relator do projeto “lei da mordaça”, na Câmara dos Deputados | Foto: José Cruz/Agência Brasil

Talvez a mídia e as autoridades ainda não tenham entendido que as redes sociais são a nova voz do povo, origem do poder

Mas em 2020 foi apresentado um projeto logo chamado de “lei da mordaça”, relatado pelo deputado Orlando Silva, do Partido Comunista do Brasil. O projeto está indo para o arquivo, com a ajuda do presidente da Câmara. Não há como não desconfiar de qualquer obra que receba influência de uma ideologia que impõe censura férrea onde quer que conquiste o poder. Assim está demonstrado pela história. Na semana passada, Arthur Lira anunciou um grupo de trabalho para modificá-lo. Tudo indica que é para justificar o enterro do projeto. Mas os adeptos do controle do Estado sobre manifestações de cidadania insistem em restringir a expressão do pensamento, inclusive no Supremo, mesmo que a liberdade de expressão seja garantida pela Constituição. Essa liberdade já sofre controles de facto por quem deveria guardar a Constituição. A Lei Maior está carente de quem a defenda. Os de natureza totalitária insistem em legislar controles sobre as redes sociais.

Talvez a mídia e as autoridades ainda não tenham entendido que as redes sociais são a nova voz do povo, origem do poder. Não é preciso ir para uma praça, subir num caixote e discursar. Basta um celular ligado a uma rede social. É a nova ágora da democracia, agora digital. Sem ser preciso gritar, a voz de cada pessoa pode alcançar os limites do universo. A mídia sente a novidade como concorrente e quer censura; os poderosos sentem o poder crescente, volumoso, da voz do povo, e querem censura. Juntos, inventam uma narrativa pueril e simplória de “defesa da democracia”. Na União Soviética de Stalin e na Alemanha de Hitler, também se usavam pretextos semelhantes para justificar o controle.

Estátua de Lenin sendo derrubada na Ucrânia
Estátua de Lenin sendo derrubada na Ucrânia, em 2014 | Foto: Volodymyr D-k/Wikimedia

Na verdade, a democracia está ferida por atos antidemocráticos que violam a Constituição, porque impõem a censura proibida, restringem a liberdade de expressão, desobedecem ao princípio do juiz natural, ao amplo direito de defesa, à iniciativa exclusiva do Ministério Público, à inviolabilidade de deputados e senadores. Ao se ferir a Constituição, fere-se o sistema democrático. Quando há alguém decidindo o que é a verdade, para suprimir o que decide ser mentira, usurpa-se o direito sagrado de cada um de escolher o que é verdade e o que é mentira. Aqui em Portugal esse arbítrio foi banido há 50 anos.

Leia também “A Avenida da Liberdade”

8 comentários
  1. Sidneia cristina da Silva zafalon
    Sidneia cristina da Silva zafalon

    É muito triste ver como o Poder Judiciário se transformou em um palanque político, o que outrora o STF era uma casa composta por juristas com renomado saber jurídico, hoje é um bando de pessoas com suas ideologias pessoais que só pensam em si.

  2. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Não sabia da história de sua demissão na CNN. Realmente foi um período onde picaretas tiraram suas máscaras de tiranos. O lado bom é que podemos os identificar agora.

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    O único objetivo da caterva instalada em Brasília nas palavras do guerrilheiro José Dirceu treinado em Cuba, é tomar o poder e nunca mais entrega-lo à população.
    O poder emana do povo e em seu é exercido por seus representantes eleitos pelo voto.
    Está na nossa CF que foi jogada na fossa dos dejetos cerebrais que tomaram o judiciário do país.
    A “defesa da democracia” é o maior projeto para silenciar o povo demonstrada pelos supremos sacerdotes da verdade deste país.

  4. MB
    MB

    Grândola Vila morena…. muito bom o artigo. Parabéns! Sairemos dessa do certamente mais fortes. O povo brasileiro está resistindo com sabedoria. Sem desespero e firmes, veremos o que é obsoleto derreter.

  5. Antonio Carlos Neves
    Antonio Carlos Neves

    Alexandre, não entendo como a respeitosa e verdadeira DEMOCRACIA de Portugal, ainda tem autoridades que prestigiam o desatinado e inútil LULA, que com frequência condena a colonização portuguesa, por atrasos na educação, por massacrar as populações originárias, pela escravidão e outras baboseiras.
    Todos sabemos que os portugueses foram quem mais se miscigenaram com outras etnias neste pais, e provavelmente, ai sim, cometeram o desatino de dar origem Lula.
    Há pouco tempo o nosso jornalismo com instintos primitivos, reportou como xenófoba uma amalucada senhora portuguesa que teve uma desavença com uma brasileira e mandou que ela voltasse para seu pais. Bastou para o atual ministro do STF Flavio Dino, dissesse que os brasileiros tem o direito de invadir Portugal e o pais deveria devolver ouro que levaram de Ouro Preto.
    Infelizmente, Flavio Dino não ter orgulho de suas origens como eu, pois é neto de portugueses.

  6. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Se existe um sujeito que tem autoridade neste país pra dizer o que é verdade e o que é mentira é o Luiz Inácio Lula da Silva

  7. João Cirilo
    João Cirilo

    Interessante como as mentes lúcidas, as pessoas inteligentes, práticas, com visão clara sobre as coisas sofrem neste país de néscios, sem outra qualificação que a ínsita necedade oportunista.
    Pois não é que o Alexandre Garcia foi demitido na esquerdista – e portanto néscia – CNN por dizer que covid tem tratamento fora de hospitais?
    Obvio que tem, eu e milhões fomos assim tratados e curados; eu poderia ser um paciente da mulher dele até porque fui de outra médica que me receitou em casa, respirador, hidroxicloroquina e ivermectina.
    Eu que estava com 50% dos pulmões já tomado pela doença e que ia de mal a pior com o “protocolo” da Prefeitura de minha cidade, espelhado no do João “fique em casa” Doria, certamente corresponsável, como muitos políticos mundo afora, por muita gente que partiu.
    Não sei o que a mulher do douto jornalista ministrou aos seus pacientes. Mas sou capaz de apostar um fio do cabelo do Alexandre de Moraes que foi a mesma receita.
    Quanto à ditadura já instalada aqui tenho leve, bem leve, esperança em 2026. Se não der, Brasília pode mudar de nome. Nova Caracas ou Havana Nova podem soar oportunas.

  8. Joel Luiz Oliveira Rios
    Joel Luiz Oliveira Rios

    LIBERDADE, LIBERDADE sempre, sinônimo de VOAR, VOAR com o arbítrio e senso de responsabilidade que o Criador nos deu. Quando pautamos as nossas vidas por estes parâmetros e, no pleno uso das nossas faculdades mentais, jamais deixaremos subvertermo-nos pelo que não é certo, de bom grado e coerente com aquele que nos criou e nos sustenta, pois o seu DNA se encontra impresso em todos os seres humanos que são humanos e seguem o manual do Criador. Jamais erraremos o caminho que nos conduz nesta terra, e além dela em vitória, e ainda deixaremos o melhor legado de um caráter exemplar para os que virão após nós.

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